A lábia afiada e a suposta credibilidade inspirada por ser um “homem de Deus” eram as principais armas usadas pelo pastor de “araque” Ivanildo Serafim de Arruda, 62 anos. O falso religioso é investigado pela Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) por embolsar cerca de R$ 300 mil após enganar pelo menos 20 pessoas ao vender pacotes turísticos fictícios com destino à chamada Terra Santa, em Israel. Carismático, o estelionatário passava dias conversando com pessoas que conhecia durante suas pregações.
Áudios obtidos pela coluna enviados pelo golpista a uma das vítimas revelam como o falso pastor agia. Ivanildo garantia passagens grátis caso as pessoas conseguissem reunir 15 interessados em realizar as viagens fictícias. Com o desejo de conhecer lugares por onde Jesus Cristo teria andado, muitos idosos chegavam a assumir o pagamento de boletos bancários para conseguirem realizar o sonho de fazer a viagem. A 3ª Delegacia de Polícia (Cruzeiro) instaurou inquérito para investigar o caso.
Para facilitar o golpe, o falso pastor chegava a oferecer viagens mais caras, colocando no roteiro países como Egito. O suspeito passava a perna nas vítimas após entregar supostos contratos e começava a receber os valores, que chegavam até R$ 20 mil. Em alguns casos, o estelionatário aliciava vítima com alto poder aquisitivo, como moradores do Sudoeste, idosos aposentado do serviço público ou servidores da ativa. Já pessoas mais humildes eram exploradas e convencidas a assumirem boletos bancários como dezenas de prestações com o pretexto de que viajariam até Israel quando quitassem o valor.
Ouça gravação do pastor de araque:
Decepção e morte
Muitas pessoas chegaram a usar boa parte das economias para realizar o sonho de conhecer a Galileia, cidade ao norte de Israel onde, segundo a fé cristã, Jesus Cristo pregou o Evangelho, curou enfermos e realizou milagres.
A polícia apura a morte de uma idosa que teria sofrido um mal súbito ao saber que havia caído em um golpe e não embarcaria mais para Israel.
“Muitas pessoas depositaram a confiança e todas as economias que tinham para realizar o desejo de fazer essa viagem. Ele se transformou em um grande destruidor de sonhos”, disse uma das vítimas do pastor de araque.
Boa parte dos golpes foram aplicados ainda em 2023 e se estenderam até este ano. Como desculpa, o pastor fake usou o conflito entre Israel e o grupo militante palestino Hamas, deflagrado em 7 de outubro de 2023, para enrolar as vítimas. “Muitas pessoas já haviam quitado todo o valor para a viagem, mas o pastor falava que o país estava em guerra e passou a adiar a ida. Quando as cobranças se intensificaram, ele passou a bloquear as pessoas no WhatsApp e desapareceu”, disse a vítima.
Todos os valores transferidos pelos fiéis iam para uma suposta agência de viagens de propriedade do pastor. A empresa, que deveria funcionar em um prédio no Setor Comercial Sul, não existe. A equipe de reportagem da coluna esteve no local para conferir se havia qualquer tipo de sinal da agência comandada pelo pastor. No ponto havia, apenas, um escritório de advocacia sem qualquer vínculo como o religioso. O pastor fake não é visto há anos no prédio onde, de fato, era dono de uma sala comercial.
O outro lado
De acordo com o delegado-chefe da 3ª DP, Victor Dan, o inquérito aberto para apurar todos os golpes está em andamento. “Estamos ouvindo as vítimas e colhendo depoimentos. Também estão tentando intimar o autor para que ele seja ouvido. Por enquanto, o caso é apurado como estelionato”, explicou.
A coluna tentou localizar o pastor, mas ele não respondeu às mensagens enviadas para o telefone que consta como sendo dele nas ocorrências policiais. O espaço permanece aberto para possíveis manifestações.
